Em conversa com a imprensa antes de embarcar de volta para o Brasil, na manhã deste sábado (24/6), em Paris, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um balanço de suas passagens por Itália, Vaticano e França ao longo da semana. “No meio de julho, vamos apresentar um projeto em que vai acontecer muita, mas muita coisa nessa questão da produção de energia eólica, de energia solar, de hidrogênio verde, porque o Brasil vai ser certamente um exportador de hidrogênio para algumas partes do mundo”
Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República
As pautas envolveram acordos comerciais, debates sobre mudanças climáticas e transição energética, financiamento para os países em desenvolvimento e para redução de desigualdades, reuniões bilaterais com líderes mundiais, perspectivas de investimento e a busca da paz entre Ucrânia e Rússia.
CLIMA – Na perspectiva energética e ambiental, o presidente reforçou o papel de protagonismo do Brasil, principalmente em função de o país ter uma matriz de energia elétrica que é 87% limpa e renovável e de ter uma matriz total de energia 50% limpa, contra 15% da média mundial. Lula anunciou que no próximo mês vai apresentar um projeto de grandes investimentos na transição energética.
“No meio de julho, vamos apresentar um projeto em que vai acontecer muita, mas muita coisa nessa questão da produção de energia eólica, de energia solar, de hidrogênio verde, porque o Brasil vai ser certamente um exportador de hidrogênio para algumas partes do mundo”, ressaltou o presidente. Para ele, o mundo tem que fazer muito para chegar perto do Brasil no que se trata de energia limpa e renovável.
Assim como havia feito na Cúpula para o Novo Pacto Financeiro, na sexta, o presidente voltou a fazer a conexão entre as discussões sobre mudanças climáticas e preservação ambiental com a questão da desigualdade.
“Coloquei a questão da luta contra a desigualdade junto com a do clima porque a desigualdade, hoje, é mais forte do que era há 30 anos. Hoje a desigualdade é múltipla. Você tem a desigualdade de renda, social, na saúde, de gênero, racial, na oportunidade. Ou seja, o mundo está mais cheio de desigualdade do que de igualdade”, cobrou o presidente.
NOVA GEOPOLÍTICA – Para equacionar as duas questões, o presidente reforçou a necessidade de que as principais instituições internacionais sejam capazes de espelhar a nova geopolítica mundial, incluam mais países nas discussões estratégicas e tenham legitimidade para que as decisões tomadas sejam, de fato, cumpridas.
“Eu tenho cobrado uma governança global que seja mais representativa. Sem uma governança global que tome decisões que sejam efetivadas e controladas, a gente tem pouca chance de ver as coisas acontecerem”
“Eu tenho cobrado uma governança global que seja mais representativa. Sem uma governança global que tome decisões que sejam efetivadas e controladas, a gente tem pouca chance de ver as coisas acontecerem”, ressaltou Lula, citando como exemplos o Protocolo de Quioto, o aporte de 100 bilhões de dólares para países em desenvolvimento e as decisões da COP-15, definidas em fóruns internacionais e que não saíram do papel. “Já faz 14 anos e não saiu o dinheiro”, lembrou o presidente.
“O dado concreto é que estamos tendo consciência de que as instituições que foram criadas logo depois da Segunda Guerra Mundial já não representam mais aquilo para a qual elas foram criadas. O Banco Mundial não representa mais, o FMI não representa mais e a própria ONU já não representa mais. O mundo de 2023 precisa de outras instituições mais fortes, mais representativas, com maior participação”, argumentou.
UNIÃO EUROPEIA-MERCOSUL – Na França, além de participar da Cúpula para o Novo Pacto Financeiro, Lula teve um almoço de trabalho com o presidente francês Emmanuel Macron, oportunidade, segundo o brasileiro, de “limpar a pauta” entre os dois países.
O principal destaque foi a conversa em torno do acordo entre União Europeia e Mercosul, que há mais de 20 anos é costurado entre os blocos. A França tem peso estratégico, porque recentemente o Congresso do país se manifestou contrariamente a cláusulas do texto, em especial no campo da agricultura. O Brasil, por sua vez, não abre mão de manter controle sobre as compras governamentais, tema essencial fortalecer a indústria nacional.
“Eu acho normal que a França tente defender a sua agricultura. Pode ser um ponto de mais dificuldade de inflexão”, comentou Lula sobre a posição protecionista que setores políticos franceses formaram em torno do acordo entre os dois blocos. “Mas é normal que eles compreendam que o Brasil não pode abrir mão de compras governamentais, porque se eu destacar para eles as compras governamentais, a possibilidade de fortalecer a indústria nacional chega a zero”, disse Lula.
Mesmo com os desafios à frente, o presidente avalia que o acordo é importante para os dois lados do Atlântico e que há possibilidade de uma saída negociada. “Nós precisamos da União Europeia e a União Europeia precisa de nós. É importante que a gente tente colocar o bom senso para negociar”, comentou. “Quanto mais livre for o comércio entre nós, melhor, desde que cada um garanta aquilo que é essencial”.
O próximo passo é o Brasil responder a uma carta adicional da União Europeia com demandas em torno do texto “Espero que tenhamos capacidade e sabedoria de resolver esse assunto”, afirmou Lula.
DIÁLOGOS PELA PAZ – A tentativa de construção de uma via que aproxime ucranianos e russos de um fim dos conflitos armados também fez parte da pauta. O líder brasileiro teve conversas em torno do tema numa audiência com o Papa Francisco, com o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, que recentemente esteve em Moscou e Kiev com uma comitiva de líderes africanos, e com o presidente da França, Emmanuel Macron.
“Nós condenamos a invasão da Rússia ao território da Ucrânia. Isso já está declarado e votado na ONU. Mas isso não implica que vou ficar fomentando a guerra. Em algum momento eles vão querer sentar para conversar. E vão precisar de interlocutores com muita responsabilidade para tentar negociar”
“O meu pensamento é simples: sou contra a guerra. Eu quero paz. Nós condenamos a invasão da Rússia ao território da Ucrânia. Isso já está declarado e votado na ONU. Mas isso não implica que vou ficar fomentando a guerra. Em algum momento eles vão querer sentar para conversar. E vão precisar de interlocutores com muita responsabilidade para tentar negociar”, resumiu o presidente.
HAITI – Um dos encontros bilaterais da agenda de Lula foi com o Primeiro-Ministro da República do Haiti, Ariel Henry. Um diálogo definido como triste. “É um país abandonado à própria sorte, dominado pelas gangues, ou seja, onde já não tem mais eleições há algum tempo. É o tipo daquela reunião que você fica constrangido, porque o mundo deveria ter uma preocupação com o Haiti”, afirmou.
Lula lembrou que o Brasil teve 13 anos com presença fixa no país da América Central depois de um grande terremoto que assolou a região em 2010 e causou a morte de 300 mil pessoas. “O único país que colocou dinheiro vivo lá foi o Brasil: 40 milhões de dólares. Mas o restante dos países que ficaram de dar contribuição não deu”, lembrou. A intenção do presidente brasileiro é levar a pauta do Haiti para fóruns como o G-20 e os Brics.
ITÁLIA, VATICANO, FRANÇA – A série de encontros, segundo Lula, foi uma ótima oportunidade de interlocução bilateral. Na Itália, o presidente se encontrou com a primeira-ministra Giorgia Meloni, com o presidente Sergio Mattarella e com o prefeito de Roma, Roberto Gualtieri. No Vaticano, teve um diálogo sobre paz e luta contra as desigualdades numa audiência com o Papa Francisco, a quem Lula convidou para participar da festa do Círio de Nazaré, em Belém.
Já na França, teve reuniões bilaterais com líderes de África do Sul, Congo, Haiti e Cuba, além do almoço de trabalho com o presidente francês Emmanuel Macron, da participação na Cúpula para o Novo Pacto Financeiro e de um discurso para milhares de pessoas durante o evento Power Our Planet, voltado para a preservação ambiental, ao lado da Torre Eiffel.
Fonte: Secom Presidência da República