Comandada por um parente do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a superintendência da Codevasf em Alagoas contratou uma obra de pavimentação em Junqueiro, interior do estado, que usou o trator de uma empresa de familiares do deputado. Em vídeo gravado no dia 27 de maio, o superintendente Joãozinho Pereira, primo de Lira, anunciou o início das obras montado em um trator que fazia a remoção de terra e o nivelamento da rua, antes da colocação de paralelepípedos. O trator exibia o logotipo do Grupo Pereira, empresa que tem como sócias a mãe e uma irmã de Joãozinho.
A obra foi custeada com recursos do orçamento secreto enviados por Lira, segundo o próprio informou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Lira destinou R$ 1,1 milhão para serviços de pavimentação da Codevasf em Junqueiro, reduto eleitoral de sua família. A verba originalmente atendeu a um contrato para a empresa Vibal Construções e Serviços executar a obra, no povoado conhecido como Atoleiro.
O vídeo de pouco mais de dois minutos exibe imagens do veículo do Grupo Pereira no local da obra, efetivamente trabalhando para remover terra e fazer o nivelamento da área.
“Trabalho acontecendo no município de Junqueiro através da Codevasf, e das emendas parlamentares do nosso deputado federal Arthur Lira e por pedido do nosso deputado estadual Fernando Pereira. A gente entrega essa bela obra dando início aqui hoje, e é trabalhando em cima da máquina. Pau na máquina”, afirma Joãozinho no vídeo.
O aluguel do maquinário é admitido pelo sócio-administrador da Vibal, Ivandi Brilhante de Araújo Jr. Ele justificou a sublocação alegando não compensar mobilizar equipamento próprio para a região. A Vibal tem sede em Barra dos Coqueiros, em Sergipe, a 160 quilômetros de Junqueiro.
– É algo normal a gente contratar um equipamento de outra empresa, inclusive para outras obras em outros contratos a gente faz aluguel de equipamento também. O problema nesse caso é que o Grupo Pereira é um grupo político, mas minha empresa não tem nada a ver com isso – argumenta o dono da Vibal, que já foi contemplada com repasses de R$ 7,2 milhões de Lira para outros serviços da Codevasf em cidades de Alagoas.
Lira: pedido de primo é parte da ‘dinâmica da política cotidiana’
Flagrados no vídeo, Joãozinho e o deputado estadual Fernando negam o aluguel do maquinário pela Vibal para a obra da Codevasf. Fernando alega que a máquina costuma ser “disponibilizada às pessoas que pedem, aos amigos, ao eleitor, às associações” locais para “melhorar o acesso” de outras estradas do povoado Atoleiro. Confrontado com a informação de que a máquina estava no local específico da obra da Codevasf, cujo projeto também prevê ações de terraplanagem, o deputado modificou sua versão e admitiu a passagem na rua em questão.
– Sim, aí o amigo quer que eu diga o quê? – questionou Fernando. – O Atoleiro tem uma estrada principal. Foi no momento que a máquina estava por lá que foi feito o vídeo.
Joãozinho afirma que não houve pagamento ao Grupo Pereira. “Jamais houve o uso de maquinário do Grupo Pereira para a realização de obras sem aluguel, com pagamento, ou sem a devida cobertura contratual em Junqueiro ou qualquer outro município”, afirmou. O GLOBO retornou a Ivandi Brilhante de Araújo Jr pedindo os contratos de sublocação do Grupo Pereira pela Vibal, mas ele recusou o envio.
Procurado, Arthur Lira argumentou que “avaliar o uso de um maquinário, se faz parte da obra ou se foi utilizado apenas para ilustrar uma ação” não faz parte de suas “funções institucionais”. Lira também disse que pedidos como o apresentado por seu primo, Fernando Pereira, para destinar emendas à obra no povoado Atoleiro fazem parte da “dinâmica da política cotidiana” e “podem ser feitos em reuniões, palanques, em visitas in loco”.
“Não cabe ao presidente da Câmara dos Deputados acompanhar processo licitatório, muito menos saber detalhes do vencedor, inclusive se uma empresa usa ou não equipamentos de terceiros”, afirmou.
/ O Globo